A ascensão das mulheres a cargos de gestão envolve uma tomada de consciência e mudanças na cultura das organizações
Ao longo da história, as mulheres sempre tiveram uma participação minoritária no mercado de trabalho formal. Geralmente encarregadas de cuidar das tarefas domésticas e dos filhos, elas precisaram lutar para conquistar seu espaço em um ambiente tradicionalmente masculino e, assim, assumir as mais diversas profissões. No entanto, embora tenham ocorrido avanços nos últimos anos, a situação ainda é desigual: dos milhões de brasileiros com empregos formais em junho de 2021, por exemplo, apenas 40,4% eram mulheres, de acordo com o Ministério do Trabalho e Previdência . Esse cenário também torna mais difícil a ascensão da liderança feminina nas organizações.
Quando o assunto é empoderamento econômico no contexto global, as mulheres estão longe de alcançar um patamar ideal. Segundo dados da ONU Mulheres , elas ganham menos que os homens para funções idênticas, enfrentam mais desvantagens ao começar um negócio e têm maiores barreiras para reivindicar as posições mais altas de liderança nas empresas. Além disso, fatores como violência e assédio no mundo do trabalho as afetam independentemente da idade, localização, renda ou condição social.
Em 2021, a Fortune 500, uma lista anual que reúne as maiores corporações dos Estados Unidos, registrou um total de 41 CEOs mulheres. Embora seja um recorde histórico, o número não chega perto de ser considerado ideal: significa que apenas 8,1% das empresas listadas têm uma pessoa do sexo feminino no seu cargo mais alto de liderança. No Brasil, os índices também permanecem baixos. De acordo com o IBGE, mesmo tendo mais anos de estudo, as mulheres ocupam 37,4% das posições de gerência no país e recebem apenas 77,7% do rendimento dos homens.
Nesse cenário, a abertura do próprio negócio se torna uma necessidade para muitas mulheres. De acordo com dados da Global Entrepreneurship Monitor, elas representam 48,7% do mercado empreendedor brasileiro, o que se deve, em grande parte, à falta de oportunidades e de reconhecimento nos empregos formais. O crescimento de 40% no número de empreendedoras durante a pandemia também está relacionado às dificuldades que elas passaram a enfrentar nas empresas para conciliar o trabalho e o cuidado com os filhos e a casa.
Diante dessas estatísticas, não há como deixar de questionar: o que podemos fazer para gerar mais oportunidades às mulheres e impulsionar a liderança feminina nas organizações? Muito se discute sobre a importância de ambientes diversos, mas o que percebemos na prática é que ainda não há equidade no mercado de trabalho. Reverter esse cenário exige uma tomada de consciência e mudanças na própria cultura e processos organizacionais.
Como promover a liderança feminina?
Por um lado, existem muitos obstáculos externos que dificultam o avanço feminino nos ambientes profissionais. Eles estão ligados, principalmente, à discriminação de gênero que ainda permeia os processos organizacionais. Essa desigualdade cria uma barreira invisível que faz com que mulheres tenham maior dificuldade para subir na carreira e, portanto, para reivindicar cargos de liderança. É o fenômeno conhecido como “teto de vidro”.
Por outro lado, há desafios internos, da própria consciência feminina, que podem comprometer a ascensão profissional. Ao longo da vida e experiências de cada uma, crenças e comportamentos limitantes passam a ser “internalizados” pelas mulheres, afetando vários aspectos de sua vida. É comum que tenham maior receio de falhar ou de não corresponder ao que a sociedade espera delas. É uma espécie de “autossabotagem”, que faz com que se sintam inseguras para expor seus pontos de vista, ter ambição no âmbito pessoal e na carreira e desenvolver a sua autoconfiança, por exemplo.
O primeiro passo para a mudança, portanto, vem das próprias mulheres. É fundamental que elas se tornem mais conscientes das suas próprias capacidades e do seu potencial para evoluir. Na prática, isso significa reconhecer que podem ser mais ambiciosas, assertivas, autoconfiantes e seguras. O processo envolve uma dose de esforço: não é fácil romper com crenças e hábitos já enraizados, mas a mudança é possível se houver intencionalidade. Nesse sentido, o autoconhecimento é um ponto muito importante. Ele permite que as mulheres se conheçam, mapeiem seus talentos e suas inseguranças e trabalhem alcançar objetivos.
Quando há liderança feminina, muitas competências são potencializadas nas empresas. Como profissionais, as mulheres tendem a ser mais cooperativas, inclusivas e empáticas. Com isso, propicia-se a criação de ambientes mais colaborativos e com maior engajamento das equipes. Durante a pandemia, países com mulheres à frente do executivo governamental apresentaram melhores resultados no enfrentamento da crise global de saúde pública. Por esses motivos, elas devem acreditar em si mesmas e na sua capacidade de contribuir de maneira efetiva nas organizações. A partir daí, podem começar a agir com mais assertividade, segurança e autoconfiança para buscar os espaços.
Outra questão que faz toda a diferença é a criação de redes de apoio entre mulheres. Quando elas se unem e influenciam umas às outras de forma positiva, impulsionam sua própria trajetória para o sucesso. As profissionais mais experientes, que já ocupam cargos de gestão, podem trazer ensinamentos e exemplos valiosos àquelas que ainda não alcançaram esses postos e, assim, alavancar suas carreiras.
Mudanças na cultura organizacional
No entanto, não é só o esforço intencional feminino que possibilita a ascensão na carreira profissional: também é importante que haja mudanças no próprio funcionamento das organizações. Um estudo da consultoria Bain & Company em parceria com o Linkedin aponta que, em comparação aos homens, as mulheres são 1,7 vezes mais propensas a serem taxadas de emotivas, demasiadamente assertivas ou agressivas no mercado de trabalho. Também são 1,5 vezes mais propensas a não serem consideradas para um cargo por conta de diferenças no estilo de liderança ou de relacionamento interpessoal. Esses índices estão relacionados a uma cultura masculina que resulta em menos oportunidades para as mulheres em suas carreiras.
Para transformar essa realidade, é fundamental que as organizações e os líderes homens também se comprometam em realizar ações concretas. Ambientes mais inclusivos e com potencial de crescimento feminino envolvem: contratar e promover mais mulheres, conhecer as capacidades e habilidades de cada profissional para conduzi-la em direção às oportunidades certas, dar abertura para que elas expressem e executem ideias e apresentar clareza sobre os propósitos não só da liderança, mas de toda a organização. Assim, é possível motivar as mulheres a reivindicarem posições mais altas e exercerem sua gestão de forma alinhada aos objetivos da empresa.
A visão sistêmica é importante nesse contexto para as organizações enxergarem a inclusão não como uma série de medidas pontuais, mas como um processo integrado a ser implementado de forma estratégica. Isso envolve o reconhecimento de que pensar somente em igualdade não é o suficiente. As mulheres, por exemplo, costumam enfrentar a “jornada dupla”: além de trabalhar, são encarregadas de cuidar da casa e dos filhos. As organizações, portanto, precisam levar em conta que elas têm características e vivências particulares. A partir disso, podem elaborar ações de acordo com suas necessidades específicas.
Por fim, não se pode esquecer da importância de estabelecer uma política de intolerância contra qualquer tipo de discriminação ou violência no trabalho, o que inclui assédio sexual e abuso verbal ou físico. Isso contribui para a criação de um ambiente de segurança psicológica, onde as mulheres possam se desenvolver, tomar consciência para conhecerem melhor a si mesmas e conquistar mais espaços de liderança.
A liderança feminina é uma das áreas de atuação da ns2a. Saiba mais sobre nosso trabalho!